A Revolução Vinagre
Julio Borges Filho
A recente manifestação jovem no mundo árabe está se alastrando por todo o planeta e chega ao Brasil. As grandes cidades brasileiras estão vendo milhares de jovens e adolescentes nas ruas protestando contra aumento de passagem de ônibus, contra os gastos na Copa de futebol, contra a corrupção, etc. Como observador deste novo movimento quero fazer algumas observações. Espero ser imparcial nelas.
Observo, em primeiro lugar, que as manifestações não têm cor, nem ideologia, nem utopia, nem vinculação política partidária. Acho mesmo que é um movimento contra o poder instituído, isto é, o três poderes da república. Diante de tantos escândalos e desgastes políticos, da corrupção e do mal uso dos recursos públicos, e da mesmice na política com a degastada briga entre PT e PSDB com suas alianças políticas, os jovens estão cansados e com um déficit de esperança. Em quem acreditar? Não têm modelos a seguir tanto na política como na religião. Esta, com o advento de líderes evangélicos adeptos da teologia da prosperidade, promovem espetáculos que cheiram ao charlatanismo e a manipulação das pessoas. Há também uma crise de paradigmas. As multidões estão, como diz o Evangelho, “aflitas e exaustas como ovelhas que não têm pastor”. É, portanto, um movimento líquido como líquida é a pós-modernidade. Daí chamá-lo de a revolução vinagre por causa da garrafa de vinagre que os jovens levam em suas mochilas para neutralizar o gás lacrimogênio da polícia.
É um movimento que não quer ser tutelado e, por isso mesmo, com múltiplos líderes. Há poucos interlocutores, mas com potencial para gerar lideranças jovens na política brasileira. O principal instrumento de convocação é a internet com as poderosas e incontroláveis redes sociais. A comunicação é rápida e as convocações são aceleradas e se multiplicam no mundo. Os governos com suas polícias não sabem ainda como lidar com isso. A repressão só impulsiona e dar combustível à juventude da classe média e alta, estudantes privilegiados das escolas particulares e das universidades públicas. É próprio da natureza da juventude protestar, e temos de incentivar a rebeldia juvenil. Só a subversão que abre portas históricas de mudança. Na minha juventude tínhamos utopias e sonhávamos com uma sociedade mais justa dentro do socialismo e, depois, com o retorno à democracia. Tínhamos modelos: Gandhi, Martin Luther King, Che Guevara, Mandela, etc. Vivíamos imersos no pré- tempo de chumbo e depois em plena ditadura. Tínhamos um alto preço a pagar e o pagamos, muitos com a própria vida. Esta geração chegou agora ao poder. Hoje, em plena liberdade democrática, protestar ganha aplausos da mídia e todo político tenta tirar uma casquinha. Os perigos são apenas os excessos da polícia.
Há perigos no ar: a manipulação política, econômica e midiática no movimento, os vândalos e aproveitadores, e a ausência de mecanismos de controle. A minha impressão é que ninguém sabe ao certo o que está acontecendo. Na há ainda uma análise de conjuntara que nos oriente quanto ao futuro deste movimento. Protestar contra a Copa do Mundo de Futebol é passageiro. Será que o movimento estudantil ultrapassa o próximo ano? Há, porém, um saldo positivo e inquestionável: Como a sociedade controlar o governo e o Estado tem sido o maior desafio da democracia moderna e, acho que, pela primeira vez com o atual movimento dos jovens brasileiros, isso pode ser possível com a mobilização popular via internet.
Essa minha análise é apenas um esboço para mais tarde ser revisto. São observações abertas. Aguardemos os acontecimentos e suas consequências.