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Pastorado: Perspectivas de Continuidade

Julio Borges Filho

O vazio e a insegurança causados quando um pastor deixa o pastorado de uma igreja – eis uma questão angustiante que me preocupa ao longo dos meus 42 anos de pastorado. A angústia reside, em primeiro lugar, no sentimento de orfandade das ovelhas deixadas e, em segundo lugar, nas incertezas da sucessão pastoral. O pastor que vem pode continuar ou destruir o ministério iniciado.

Estou absolutamente convencido de que o ministério pastoral, vital para as ovelhas-gente, para as igrejas e para o Reino de Deus, precisa ser encarado com seriedade. Precisa de continuidade. Via de regra ele tem sido encarado à semelhança de governos mundanos, egoístas e de visão míope que só enxergam até o fim de seu mandato. O que vem depois não lhes interessam, mesmo que seja o caos. Tal mentalidade mundana não consulta os reais interessas das igrejas. O que fazer? Desejo contribuir, à luz de minha experiência e da Bíblia, com uma receita simples: O conselho de Jetro, a filosofia de ministério de João Batista, a missão de Jesus, e a sabedoria de Pelé.

 

  • O conselho de Jetro: “Tu só não o podes fazer” – Êxodo 18:17.

Moisés, cansado, precisava de auxiliares e não o sabia. Julgava-se capaz de fazer tudo sozinho. Seu sogro o aconselhou, e esse conselho foi registrado na Bíblia porque nem todo líder tem um sogro tão sábio. Quantas vezes cometemos o mesmo erro de Moisés, e nos afadigamos na solidão e no acúmulo de trabalho. Formar uma equipe de auxiliares idônios: homens e mulheres “tementes a Deus, de verdade, que aborreçam a avareza”. Investir nestes líderes e dar-lhes tarefas definidas é nos multiplicar e dar continuidade ao nosso ministério mesmo depois de deixá-lo. É claro que o nosso poder diminui quando compartilhado.

 

  • A filosofia de ministério de João Batista: “Convém que Ele cresça e que eu diminua” – João 3:20.

A glória do pastor é o crescimento do corpo de Cristo. Mas para que Ele cresça é necessário que ele diminua. Na verdade o clericalismo e o autoritarismo são nocivos à igreja. O pastor, compreendendo isso, deve criar espaço para que outras lideranças no meio da comunidade surjam. A descentralização administrativa e a formação de uma consciência democrática e solidária são fundamentais. Tive boas experiências em meus pastorados estruturando igrejas em sete ministérios conforme os dons básicas de Romanos 12:1-8. Assim muitas atribuições até então atribuídas ao pastor, passou para outros líderes eleitos pela igreja e mais capazes na sua área. Eis os sete ministérios segundo os mandatos bíblicos: Ministério pastoral (coordenador), Ministério do culto, Ministério do Evangelismo, Ministério da educação cristã, Ministério da administração, Ministério da comunhão,e Ministério do serviço. Aliado a isso organizei as igrejas em grupos de base composto de no máximo 10 famílias, com seus líderes treinados. As igrejas cresceram, eu diminuí, e esta precisamente foi a minha grandeza.

 

  • A Missão de Jesus: “Assim como o Pai me enviou, Eu vos envio” – João 20:21.

Vivemos uma crise de consciência de missão nas igrejas. Muitas assumem os valores da sociedade, reproduzindo-os, e não os valores do Reino de Deus. Daí a maioria dos problemas que enfrentamos. É a missão que dá sentido à vida cristã e às igrejas. Centralizar-se nela é imperativo revolucionário. A igreja é uma comunidade enviada nos moldes de Jesus Cristo ao mundo das necessidades humanas. Ela é portadora de uma mensagem que “Boas Novas” de salvação porque única saída para a vida e para a história humanas. Conscientizar o seu povo de sua missão é plantar para a eternidade e continuar dentro do coração de Deus. Observa-se que a perda do sentido de missão atingiu em cheio a educação cristã. Nossos programas educacionais objetivam mais formar membros de igreja do que cristãos para o mundo. Creio que o ideal seria encontrarmos um meio de planejarmos um Programa de Educação Cristã baseado nos dons dos crentes (Romanos 12:1-7) para sairmos do estado de conformação com mundo e entrarmos num estado de revolução permanente.

 

  • A sabedoria de Pelé: saber sair na hora certa.

Tal sabedoria não é alcançada por muitos que, por isso mesmo, permanecem numa igreja prejudicando-a. Nós podemos abreviar o nosso ministério como Moisés por causa de nossos erros. Moisés soube sair, por imposição divina, mas preparou Josué para sucedê-lo e concluir a missão: levar o povo de Deus à conquista da terra prometida. O povo não é nosso, é de Deus. Não somos insubstituíveis. Precisamos nos avaliar profundamente ainda que para tanto precisemos deixar o pastorado. Uma certeza deve nos acompanhar: “Eu plantei, Apolo regou, mas Deus é que dá o crescimento.” O ministério pastoral é uma obra contínua realizada por homens e mulheres vocacionados por Deus.

 

Após explicar a receita simples, uma certeza inabalável: Enquanto houver igrejas de Jesus Cristo, haverá pastores e líderes. Lembro da fina ironia do saudoso Dr. Vidal de Freitas, um juiz e pastor aposentado. Um espírita lhe disse, em irônica crítica, que eles não precisam de pastores. Eis a resposta dele: “É que vocês são plantas bravas. Não precisam de cuidado para nascerem e crescerem. Nós, porém, somos plantas de jardim. Precisamos de trato, de carinho e de cuidados especiais.” Cuidar do rebanho de Cristo, amá-lo sacrificialmente, é amar o próprio Senhor. Ele disse a Pedro após sua tripla declaração de amor: “Apascenta minhas ovelhas.” Tal ministério precisa de perspectivas de continuidade porque é eterno.

Júlio Borges de Macedo Filho

PASTOR JULIO BORGES DE MACEDO FILHO Piauiense de Curimatá, 72 anos com 48 de pastorado, filho de Julio Borges de Macedo e Arquimínia Guerra de Macedo, é o sétimo filho de uma família de onze irmãos. Casou-se, há 48 anos no dia de sua ordenação ao ministério pastoral, com a professora Gislene Rodrigues Lemos de Macedo e tiveram quatro filhos: Juliene, Jusiel (falecido), Julinho e Julian. Agora Deus lhe deu a primeira neta chamada Sarah, de apenas 8 anos. Concluiu o curso de Bacharel em Teologia pelo Seminário Teológico Batista do Norte do Brasil, em Recife. Formou-se em 1969 e foi ordenado ao ministério pastoral no dia 22 de fevereiro do mesmo ano. Pastoreou as seguintes igrejas: Igreja Batista do Rio Largo – AL (1969 a 1972), Primeira Igreja Evangélica Batista de Teresina – PI (1972 a 1978), Primeira Igreja Batista de Ilhéus – BA (1978 a 1979), Terceira Igreja Batista do Plano Piloto – Brasília (1979 a 1989), Igreja Batista Noroeste de Brasília (interinamente em 1985), Primeira Igreja Batista de Curimatá – PI (interinamente em 2000), e desde 1989, a Igreja Cristã de Brasília. Tomou a iniciativa para a organização das seguintes igrejas: Primeira Igreja Batista de Picos –PI, Igreja Batista do Lago Norte – Brasília, Igreja Batista Noroeste de Brasília (hoje, Igreja Batista Viva Esperança), e a Igreja Cristã de Brasília. Ordenou cerca de 20 pastores e uma pastora, consagrou dezenas de diáconos e diaconisas por onde passou, e celebrou mais de 500 casamentos. É considerando no Distrito Federal um pastor de pastores. Líder denominacional foi presidente da Convenção Batista Alagoana, da Convenção Batista do DF (três vezes), do Conselho de Pastores Evangélicos dos DF (duas vezes); participou de vários organismos batistas como o Conselho de Planejamento e Coordenação da Convenção Batista Brasileira, das juntas administrativas do Seminário Teológico Batista Equatorial e do Seminário Teológico Batista do Norte do Brasil; e por 20 anos foi professor da Faculdade Teológica Batista de Brasília ensinando as seguintes disciplinas: Estudos de problemas brasileiros, ética cristã, teologia pastoral, teologia contemporânea, ministério urbano, teologia bíblica do Antigo Testamento, e homilética. Como teólogo produziu muitos artigos, teses, e palestras nos mais diferentes lugares, e participou de muitos congressos, seminários, fóruns, retiros, entre eles o Congresso Internacional Lousane II realizado em Manila, Filipinas em 1989. Foi orador de várias assembléias convencionais, e pregou em muitos congressos e igrejas por todo o Brasil. Como poeta e escritor já gestou e publicou cinco livros (Missão da Igreja e responsabilidade social, Voando nas asas da fé, Um sonho coberto de rosas, Suave perfume, e Uma grande mulher), tem quatro prontos para publicação, e está grávidos de mais dez livros que espera escrever e publicar nos próximos oito anos. Na área política assessorou deputado Wasny de Roure, por muitos anos, tanta na CLDF como na Câmara dos Deputados; assessorou por pouco tempo os deputados distritais Peniel Pacheco e Arlete Sampaio; o Ministro da Educação, Cristovam Buarque, como chefe da Assessoria Parlamentar do MEC, e depois assessor parlamentar do Senador Cristovam Buarque. Nesta área produziu muitos escritos sobre os evangélicos e a política, fez inúmeras palestras, promoveu muitos seminários, e foi fundador e coordenador de vários fóruns, entre eles o Fórum Político Religioso do PT, o Fórum Religioso de Diálogo com GDF, o Fórum Cristão do PT Chegou a Brasília em junho de 1969 e, desde então, a elegeu como sua cidade do coração. Agora, aposentado, deseja dedicar-se a apenas duas atividades essenciais: pastorear graciosamente a Igreja Cristã de Brasília e Brasília, e escrever apaixonadamente. Sua grande ênfase ministerial tem sido o amor cristão, a graça maravilhosa de Deus revelada em Jesus Cristo, a responsabilidade social das igrejas e dos cristãos, e o ministério urbano da igreja.

Um comentário sobre “Pastorado: Perspectivas de Continuidade

  • Achei o artigo excelente. É necessário fazer líderes sucessores, é ncessário que Jesus cresça em nós e por nós para sermos enviados e muita sabedoria para saber que precisamos tirar as cargas da vida e do ministério. É necessário que nos tornemos mais leves e sábios. Parabéns pastor Julio por sua visão e missão.

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