A REVOLUÇÃO FEMININA
Sermão A REVOLUÇÃO FEMININA – Lucas 1:46-55
Julio Borges Filho
Eu tenho um hábito com minha esposa de assistir um filme nas segundas-feiras no Cine Cultura Liberty Mall aqui em Brasília. É o quintal de nossa casa. Um dia encontrei lá um amigo da Água Mineral, Laurez, um jornalista que estava sozinho. Ele me informou que estava esperando a esposa que viria do trabalho. Falei sobre o filme que iríamos assistir, e ele me disse que iria assistir outro para a agradar sua esposa. Disse-me que seguia a risca um conselho de um professor na faculdade: “Se você quiser ser feliz no casamento, deixe sua esposa mandar. Caso contrário ela ficará estressada, ela só quer o seu bem.” Quando ela chegou, mudou de opinião e foram assistir o mesmo filme nosso. Achei o conselho sábio e desde então eu o estou colocando em prática em casa e tudo melhorou. O que estou propondo hoje é: deixemos as mulheres mandarem. Nós homens já fizemos muitos estragos com guerras, escravidão, inclusive das mulheres que por milênios foram anuladas para a glória dos homens. Agora o governo das mulheres irá nos restituir o cuidado, o carinho, a solidariedade e o amor.
Marginalizada e explorada durante milênios na história humana, a mulher tem feito uma verdadeira revolução nos últimos tempos. No projeto de uma sociedade justa e fraterna que sonhamos é fundamental a participação e o governo das mulheres em todas as áreas da vivência humana.
A mais bem-aventurada entre as mulheres, Maria, a grande mãe de Jesus, lançou em seu cântico, o Magnificat, as bases de uma revolução feminina que objetiva a construção de uma nova humanidade com uma nova ordem no mundo. Ela foi a única mulher a usar a rosa rubra da maternidade e a rosa branca da virgindade na concepção do seu primeiro filho que foi concebido nela pelo Espírito Santo, a Rua, brisa de Deus, a mãe da criação e de tudo. O cântico de Maria assemelha-se ao cântico de Ana, a grande mãe de Samuel, um dos maiores homens da história sagrada. Ela, estéril e humilhada pela sua rival, Penina, a segunda esposa de Elcana, pediu em amargura e dor um filho a Deus que seria devolvido a Ele quando desmamasse. E assim aconteceu, e Ana louva a Deus em 1 Samuel 2:1-10. É um cântico libertário. Talvez por isso Stanley Jones, o grande missionário metodista na Índia, tenha dito que o cântico de Maria é o documento mais revolucionário da civilização ocidental. O Magnificat fala de quatro revoluções fundamentais para a humanidade. Antes, porém, de falar delas, desejo falar da beleza da mulher que o cantou.
A BELEZA DA MULHER – Vrs. 46-50
Maria tinha a alma afinada com Deus, vrs 46 e 47. Era uma mulher apaixonada por Deus.
Poesia: Uma mulher
Não existe nada mais belo
que a beleza de uma mulher apaixonada
e controlada por Deus.
É brisa suave e pura,
é roseira florida e perfumada
embelezando os céus.
Seu olhar é mais olhar…
Seu sorrido é bálsamo cheio de paz.
Uma mulher que ama,
é cântico que enleva,
é pão que alimenta e satisfaz,
é água, é chama.
A vida é bem mais vida
se ela está ao nosso lado
aquecendo o viver.
Ela é música divina,
é musa, é poesia, é cântico inspirado
a embalar todo o ser.
Vejam humildade e grandeza da mãe de Jesus nos vrs. 48 e 49: “Então disse Maria: A minha alma engrandece ao Senhor, e o meu espírito se alegrou em Deus, meu Salvador. Porque o Poderoso me fez grandes coisas, Santo é o seu nome”. Exatamente nesta ordem: a humildade antes da grandeza porque a grandeza antes da humildade impede a humildade de florescer e só serve aos déspotas. Jesus colocou a medida exata da vida quando disse: “quem se humilha será exaltado, e que se exalta será humilhado.” Humildade vem de humos da terra, de humanidade e resgata o que de melhor há no ser humano porque é o reconhecimento de nossa finitude. O universo tem quatro colunas baseada nos seus quatro fiats: o primeiro, fiat lux, “faça-se a luz” foi feito pelo Criador e deu origem toda a criação; o segundo foi o fiat de Nazaré, da jovem Maria, quando o anjo veio comunicar que ela seria a mãe do Salvador: “Eis aqui a serva do Senhor, faça-me em mim conforme a tua palavra”, e Jesus Cristo nasceu, encarnou e andou entre nós; o terceiro foi o fiat de Jesus no Getsêmane: “Pai, se possível, passa de mim este cálice… Todavia faça-se a Tua vontade e não a minha”, e nasceu o redenção; e, finalmente, o nosso fiat, sem o qual havia no mundo a sombra do caos: “…faça-se a Tua vontade aqui na terra como ela é feita no céu”, e assim veio nossa missão no mundo.
Ela reconhece os rastros de Deus na história, v.50: “A sua misericórdia vai de geração a geração sobre os que o temem.” Vale a pena ressaltar que a misericórdia divina é para todos sem exceção, mas só os que os temem têm acesso a ela. Não é Deus quem exclui, mas é o homem que se exclui por não aceitar tão infinita graça.
A REVOLUÇÃO FEMININA
A revolução feminina te quatro aspectos ou quatro revoluções:
1 – A revolução moral, v 51: “Agiu com o seu braço valorosamente. e dispersou os que, no coração, alimentavam pensamentos soberbos. O soberbo é o orgulhoso de si mesmo, portanto um idólatra que adora a si mesmo. É o farisaísmo em seu aspecto negativo e soberbo que exclui os outros e se julga superior aos demais. E isso provoca todo tipo de preconceito, intolerância e fundamentalismo religioso. Jesus denunciou isso na Parábola do Fariseu e o Publicano. O fariseu dá graças a Deus por si mesmo considerando-se superior e mais fiel do que os outros, e despreza o publicano que está orando a seu lado. O publicano, de cabeça curvada diante de Deus, apenas murmura: “Ó Deus, sê propício a mim, pecador”. Este, afirmou Jesus foi justificado, e o fariseu continuou consigo mesmo, mas sem a aprovação divina. Foi jogado fora, dispersado. E isso tem a ver com a moral, e nunca com a moralidade. Esta é uma deturpação daquela e precisa ser desmascarada na sociedade e na igreja. Trata-se de uma revolução necessária ao mundo e ao Brasil, especialmente no atual momento que vivemos.
2 – A revolução política, v 52a: “Derrubou de seu trono os poderosos…”
– Os que se acham grandes. Geralmente são soberbos e vivem na ilusão. Quando o imperador romano vinha de uma vitória militar e entrava triunfalmente em Roma sendo saudado pela população, um sacerdote vinha a seu lado dizendo: “Lembra-te de que és homem”. Isso para que ele não se julgasse um deus e se tornasse um déspota que tudo pode. O saudoso bispo Robinson Cavalcanti gostava de frisar que a história humana é um cemitério de impérios. Onde estão os grandes reis e imperadores? Foram julgados e derrubados por Deus num julgamento histórico exemplar. Quanto mais se tem poder, mais humilde se deve ser porque a essência do poder é servir e jamais ser servido ou se servir. É a deturpação da política que nos traz a tirania ou a corrupção. Por isso a revolução política é essencial ao mundo.
3 – A revolução social, v 52b: “…e exaltou os humildes” – A inclusão social é a base para se julgar um governo. Se não há inclusão social como acesso aos direitos básicos do ser humano de sustento condigno, à saúde, à educação e à justiça, um governo não passa de governo dos ricos. Jesus Cristo, o Senhor dos Senhores, fez um convite aos excluídos de sua época: “Vinde a mim todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração, e achareis descanso para as vossas almas. Porque o meu jugo é suave e o meu fardo é leve” – Mateus 11:28-30. Aumenta no Brasil e no mundo a pobreza e a miséria, e por trás de toda reforma promovida pelas elites, aumenta mais seus privilégios. Daí a revolução social ser tão necessária, e ninguém melhor que as mulheres para promovê-la.
4 – A revolução econômica, v. 53: “Encheu de bens os famintos e despediu vazios os ricos.”- Aumenta cada vez mais no mundo e, especialmente no Brasil, as desigualdades econômicas. Os ricos estão cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres. Razão tinha o Apóstolo Paulo quando afirmou que “o amor ao dinheiro é a raiz de todos os males” – 1 Timóteo 6:10a. Desconfio de toda reforma econômica promovida pelas elites econômicas pois objetiva sempre a concentração de riquezas nas mãos de poucos e a produção de mais miséria e pobreza. Cada vez mais se concentra a riqueza nas mãos de poucos. Quando vai acabar a exploração do homem pelo homem? Só um governo genuinamente feminino, pleno de amor e solidariedade humana, poderá nos libertar da tirania do capitalismo desumano e destruidor das riquezas que Deus nos deu para todos: as florestas, os minérios, o petróleo, os rios, o mar, em suma, toda a criação na terra. É necessário encher de bens os famintos e se esvaziar os ricos.
O Magnificat está diante de cada mulher. Nós homens já teríamos destruído o mundo mais do que já fizemos com o nosso testosterona belicoso. Precisamos do cuidado, carinho e amor femininos. Aliás, o mundo preciso disso. Portanto, curvemo-nos diante das mulheres porque elas só querem o nosso bem se não copiarem os nossos vícios.
A revolução feminina esboçada no Magnificat de Maria exalta a grandeza de Deus e dar a real medida do ser humano, dispersa os soberbos pregando a igualdade dos seres humanos, derruba os poderosos resgatando a política em sua busca ao bem comum, exalta os humildes semeando justiça social, e distribui as riquezas restaurando a dignidade humana.
O Brasil e o mundo precisam desesperadamente dela.