Sermões

DEUS É ALEGRE

Pastor Julio Borges Filho

1 João 4:7-16 e 1 Co 13:5-8

“O amor não se alegra com a injustiça, mas regozija-se com a verdade”


Introdução

– “Deus é amor”, Deus é paciente, Deus é bondoso, Deus é humilde, e agora, Deus é alegre porque Ele “não se alegre com a injustiça, mas regozija-se com a verdade.” A Bíblia Mensagem, numa tradução contemporânea, afirma:  “Não festeja quando os outros rastejam, seu prazer está no desabrochar da verdade”. E o Salmo 97:2 acrescenta: “O direito e a justiça são as âncoras do seu governo”.

 Humberto Eco, em o Nome da Rosa, tem um monge que nunca ri e que defende a tese de Jesus nunca riu e, ainda, que sorrir é prova de irreverência e superficialidade. Dou outro lado surgiu recentemente nos EUA uma igreja do riso. Busquemos o equilíbrio. O saudoso pastor Albérico de Souza contava uma história acontecida numa igreja batista em Recife. Uma alegre e linda moça foi à igreja num domingo pela manhã sorrindo e cantando pelas ruas, cumprimentado a todos pelo caminho. Ao chegar, logo na porta do templo, foi recepcionada por um idoso e severo diácono, vestido de terno escuro, que a repreendeu duramente: “Minha filha, você está sorrindo por quê? Muito riso é sinal de pouco siso. Moça crente deve ser moça séria…” A moça, diante da reprimenda, decepcionada, voltou chorando para casa e contou o ocorrido ao pai que não era crente, mas era um bom pai. Consolou sua filha levando-a para uma chácara próxima. Lá a inconsolável moça foi acariciar um velho cavalo chamado Rio Branco. Abraçou o seu pescoço, passou as mãos em suas crinas e disse: “Ah, meu cavalo velho Rio Branco, você daria um bom diácono de minha igreja!…”

– Ser cristão não é ser chato, mas alguém que fez opção pela vida abundante oferecida por Jesus Cristo. O Pai é alegre, O Filho é alegre, O Espírito é alegre, e nós somos desafiados a ser afetados pela alegria da Trindade Santa.

A alegria de Deus no Antigo Testamento

             “Alegrar-se” e “exaltar” são palavras de procedência estrangeira na língua hebraica do AT. Mas a alegria divina se expressa logo na criação. Em meio ao caos e sua feiura e tristeza, o primeiro elemento criado é a luz trazendo alegria e sentido a tudo. Depois vem a água trazendo vida, ervas e diversidade de árvores preservando tudo, o sol, a lua e as estrelas sorrindo no céu infinito, os peixes e as aves nadando e voando alegremente, os animais selvagens e domésticos e, finalmente, o ser humano, macho e fêmea, para administrar a criação e um belo e alegre jardim como moradia. A segunda criação, após o dilúvio, é celebrada com a alegria do vinho por Noé e pela esperança do pacto divino do arco-íris.

Mas é na relação de Deus com Abraão que temos uma página belíssima sobre o bom humor divino. Em Gênesis 17 e 18 Deus muda os nomes de Abrão para Abraão (pai enaltecido) e o de Sarai para Sara (princesa) e lhes promete um filho na velhice. Abraão morre de rir com a cara em terra porque ele já beirava os noventa anos e Sara os oitenta. Sara, a princesa oitentona, também sorri na tenda ouvindo a estranha promessa. E Deus então diz que o homem do filho seria Isaque (riso). Mais tarde Jesus afirma: “Abraão, vosso pai, alegrou-se por ver meu dia, viu-o e regozijou-se” – João 8:56. Jacó, após uma profunda experiência com Deus, ao encontrar-se com seu irmão Esaú, afirmou: “Quando vi seu rosto, foi como se tivesse visto o rosto de Deus sorrindo  para mim” – Gn 33:11. A Bênção Sacerdotal deseja que Deus levante o seu rosto sobre nós e nos dê a paz. É bom imaginar tal rosto sorrindo porque Deus sorri amorosamente para nós.

Nos cânticos de louvor, especialmente nos salmos de Davi, a alegria é constante: “Tu me farás ver os caminhos da vida; na Tua presença há plenitude de alegrias, na Tua destra, delícias perpetuamente”– Salmo 16:11. Ir a Jerusalém e ao templo   significava uma explosão de alegria: “Alegrei-me quando me disseram: vamos à casa do Senhor” – Salmo 122:1. E os profetas quando vislumbram a vitória escatológica colocam a alegria como característica máxima do mundo vindouro: “Saireis com alegria e em paz sereis guiados; os montes e os outeiros romperão em cânticos diante de vós, e todas as árvores do campo baterão palmas” – Isaias 55:12. Aqui a natureza participa da alegre vitória sobre o mal no mundo. Este só traz tristeza e morte. Está aberta a porta para a grande alegria do Novo Testamento.

A alegria de Deus revelada em Jesus Cristo

             O magnificat, o cântico de Maria, além de revolucionário começo com uma nota de alegria: “A minha alma engrandece ao Senhor, e o meu espírito se alegrou em Deus, meu Salvador” – Lc 1:46 e 47. No anúncio aos pastores de Belém, no primeiro natal, o anjo diz: “Não temais, eis aqui vos trago boa nova de grande alegria que será para todo o povo: é que hoje na cidade de Davi vos nasceu o Salvador, que é Cristo, o Senhor” – Lc 2:10 e 11. E no oriente uma misteriosa estrela sorri nos céus para os magos indicando o caminho para Belém.

Na sua vida e em seu ministério Jesus era alegre. Gostava das festas sociais. Seu primeiro milagre foi a transformação de água em vinho em Caná da Galiléia numa festa de casamento. O vinho é o símbolo da vida e da alegria. Seus adversários chamaram-no “comilão e beberrão” por causa de sua intensa vida social. Ele gostava de uma boa comida, da amizade com as mulheres, e das coisas boas da vida. Seu bom humor é revelado nos apelidos dados aos seus discípulos e nas respostas irônicas a seus adversários (fariseus, escribas e saduceus). Gostava de contar história e em duas delas (a da dracma perdida e da ovelha perdida – Lc 15), ele diz que os céus e os anjos de Deus se alegram quando um só pecador se arrepende. Esta alegria da Salvação invade a vida terrena. Tanto que Davi já pedia: “torna a dar-me a alegria da Tua salvação” – Salmo 51. Certa feita quando seus discípulos retornaram eufóricos de uma missão, Jesus lhes diz: “Alegrai-vos, não porque os espíritos se vos submetem, e sim porque vosso nome está arrolado nos céus” – Lc 10:20. A santidade de Jesus era uma santidade alegre, tanto que atraia os pecadores e as crianças.

Na promessa da vinda do Espírito Santo, O Consolador, Ele promete: “A alegria que eu vos der ninguém poderá tirar” – Jo 16:22. Na Oração Sacerdotal, em João 17, e ora por seus discípulos de todas as épocas pedindo que seu gozo seja completo neles. Entrar no Reino é entra “no gozo do Seu Senhor” – Mt 25:21 e 23. A ressureição é pura e incontida alegre: “Alegraram-se os discípulos ao verem o Senhor”. A tristeza e a derrota dão lugar à alegria e à vitória. No Pentecostes a alegria transborda nos corações dos crentes: “Tomavam suas refeições com alegria e singeleza de coração” – At 2:46. E no banquete escatológico, em Apocalipse 19, o ajuntamento universal das criaturas explode de alegria diante do trono do Cordeiro. Sim, porque afirma Paulo, “o Reino de Deus não comida nem bebida, mas justiça, paz e alegria no Espírito Santo” – Rm 14:17.

A alegria de Deus em nós

            A carta paulina aos filipenses é, sem dúvida, o livro mais alegre da Bíblia. Nela há um refrão significativo: “Alegrai-vos sempre no Senhor; outra vez vos digo: alegrai-vos”. O apóstolo estava velho, quase cego, sozinho, preso e aguardando a sentença de morte em Roma quando a escreveu, e faz um preciso diagnóstico dos ladrões da alegria.

O primeiro ladrão são as pessoas. Elas são motivo de alegria e de aborrecimentos. Por isso alguém já disse: “Eu amo a humanidade, o que não gosto é das pessoas.” Na convivência humana há o ódio e a maldade e, até mesmo na comunhão da igreja, enfrentamos problemas. Assim Paulo escreve para que duas mulheres de Filipos, Evódia e Síndique, pensem concordemente no Senhor – 4:2. Daí o desafio cristão é o amor e a leis da mutualidade, e uma delas diz: “Alegrai-vos uns com os outros…”.

O segundo ladrão da alegria são as circunstâncias adversas, os problemas da vida. Não temos o controle de tudo, e estamos sujeitos às diversas circunstâncias e aos ventos contrários da vida. Li a história de um alegre cristão viajando de trem na Índia, e todas as vezes que havia um solavanco, ele dizia “Aleluia”. Alguém lhe perguntou a razão das aleluias em cada solavanco, e ele respondeu alegremente: “Tenho-as presa na garganta. Quando vêm os solavancos, elas saem naturalmente.” Por isso há dois curiosos e sábios versículos paulinos: “Todas as coisas concorrem para o bem daqueles que ama a Deus…” e “em tudo dai graças”. Este último é de uma sabedoria alegre: não devemos dar graças por tudo, mas em todas as circunstâncias da vida há sempre motivo de ação de graças. E o apóstolo aprendeu o segredo da vida quando disse: “Aprendi a viver contente em toda e qualquer situação”. E mais: “Posso tudo naquele que me fortalece”.

O terceiro ladrão é a solidão porque fomos criados para a comunhão. Ninguém é feliz sozinho embora precisamos aprender a conviver com a solidão. Mas até Jesus Cristo, O Filho de Deus, precisou da companhia de amigos e amigas. Com eles o caminho por este mundo é mais alegre.

E, finalmente, a coisas podem roubar nossa alegre se somos escravos delas. Martin Buber, o grande filósofo judeu, afirma que “coisas foram feitas para serem usadas, e pessoas para serem amadas. Quando amamos as coisas e usamos as pessoas somos idólatras”. As necessidades materiais são fonte de preocupação. Daí as exortações de Jesus contra a ansiosa preocupação da vida por falta das coisas como comida, vestes, etc. Ele nos incentiva a olhar para as aves e para a flores do campo e a confiar plenamente em Deus. É em Filipenses 4:19 que está meu verso predileto da Bíblia: “E o meu Deus, segundo a sua riqueza em glória, há de suprir em Cristo Jesus cada uma de vossas necessidades.”

            A alegria da salvação é a maior de todas as alegrias. É ela que dá sentido à vida na terra e faz festa no céu. “Torna a dar-me a alegria da tua salvação”, suplica Davi carente do perdão divino. Conta-se que um crente filo-pentecostal atrapalhava muito seu pastor nos sermões dominicais com suas constantes explosões de alegria. Num domingo o pastor precisava transmitir uma preciosa mensagem à sua igreja e não queria ser interrompido. Chamou o referido crente e disse que ele deveria ficar no gabinete pastoral lendo um livro e não fosse participar do culto. O puro crente obedeceu. Quando o pastor estava no meio do sermão o crente entra correndo gritando “aleluia, aleluia”. O pastor disse-lhe: “O que aconteceu, meu irmão?” Ele respondeu: “O livro que você me deu é maravilhoso”. Mas eu lhe dei uma atlas geográfico”, retrucou o pastor. O alegre crente argumentou: “E li aqui que lá no Japão o mar atinge mais de cinco mil metros de profundidade, e quando eu penso que Jesus lança nossos pecados no fundo do mar, eu me alegro. Aleluia!…” E toda a igreja explodiu em alegria dizendo: “Aleluia!…”

A igreja deve ser a comunidade da alegria. E a alegria é cosmética porque “ o coração alegre aformoseia o rosto” – Pv 15:13. A alegria dá moral e comunica força: “A alegria do Senhor é a vossa força” – Nm 8:5-12.  A alegria é terapêutica, como nos recomenda Filipenses 1:1-11. Ter os irmãos na mente e no coração é prova de saúde espiritual. E, ainda, a alegria é criativa porque a tristeza segundo o mundo mina as forças da vida, castrando nossas mais belas formas de defesa dadas pelo criador. Semenste de alegria são plantadas no solo de um coração bom, afirma o Salmo 97:11.

Já faz algum tempo adotei uma teologia de vida especial: a teologia do aprazimento, baseada em 1 Timóteo 6:17 onde diz que tudo Deus fez para o nosso aprazimento. As pequenas coisas da vida nos estimula grandes prazeres: o sorriso de uma criança, a beleza de uma mulher, a presença de um amigo, um cântico de um pássaro, uma bela lua, uma estrela, etc. Deus “põe um pouco do céu em nosso coração para que nunca desejemos menos que o céu” – 2 Co 5:5.

Finalmente, a esperança cristã em nós de novos céus e nova terra nos quais habitam a justiça, faz-nos olhar para o futuro com enorme alegria e jamais nos desesperar diante da maldade do mundo. Assim nos garantiu Jesus: “Estas coisas vos tenho dito para que em mim tenhais paz. No mundo, passais por aflições; mas tende bom ânimo; eu venci o mundo” – João 16:33.

 Conclusão

Nada de tristeza. Ela um sentimento incômodo para quem está escravizado a ela. “Tristeza, por favor vai embora, a minha alma que chora está vendo o fim…”, diz a famosa canção popular. A tristeza destrói e é também um sentimento incômodo para quem convive com alguém escravizado a ela; é um sentimento utilizado para chamar a atenção sobre minha incomparável situação.

– Somos chamados a ter a mente de Deus em Cristo, positiva e alegre. Ouvi falar de um raio de luz que queria conhecer a obscuridade. Saiu na velocidade da luz e entrou em áleas sóbrias, cavernas escura, mas nunca conseguiu porque onde chegava clareava ao redor. Jesus disse: “Jesus sou a luz do mundo. Quem me segue não andará em trevas, mas terá a luz da vida.” Ele também disse: “Vós sois a luz do mundo…” E o mundo precisa ficar mais claro e mais belo. Levemos a luz da alegria contra a escuridão e a tristeza do mundo.

– Deus é alegre… Sejamos alegres…

Júlio Borges de Macedo Filho

PASTOR JULIO BORGES DE MACEDO FILHO Piauiense de Curimatá, 72 anos com 48 de pastorado, filho de Julio Borges de Macedo e Arquimínia Guerra de Macedo, é o sétimo filho de uma família de onze irmãos. Casou-se, há 48 anos no dia de sua ordenação ao ministério pastoral, com a professora Gislene Rodrigues Lemos de Macedo e tiveram quatro filhos: Juliene, Jusiel (falecido), Julinho e Julian. Agora Deus lhe deu a primeira neta chamada Sarah, de apenas 8 anos. Concluiu o curso de Bacharel em Teologia pelo Seminário Teológico Batista do Norte do Brasil, em Recife. Formou-se em 1969 e foi ordenado ao ministério pastoral no dia 22 de fevereiro do mesmo ano. Pastoreou as seguintes igrejas: Igreja Batista do Rio Largo – AL (1969 a 1972), Primeira Igreja Evangélica Batista de Teresina – PI (1972 a 1978), Primeira Igreja Batista de Ilhéus – BA (1978 a 1979), Terceira Igreja Batista do Plano Piloto – Brasília (1979 a 1989), Igreja Batista Noroeste de Brasília (interinamente em 1985), Primeira Igreja Batista de Curimatá – PI (interinamente em 2000), e desde 1989, a Igreja Cristã de Brasília. Tomou a iniciativa para a organização das seguintes igrejas: Primeira Igreja Batista de Picos –PI, Igreja Batista do Lago Norte – Brasília, Igreja Batista Noroeste de Brasília (hoje, Igreja Batista Viva Esperança), e a Igreja Cristã de Brasília. Ordenou cerca de 20 pastores e uma pastora, consagrou dezenas de diáconos e diaconisas por onde passou, e celebrou mais de 500 casamentos. É considerando no Distrito Federal um pastor de pastores. Líder denominacional foi presidente da Convenção Batista Alagoana, da Convenção Batista do DF (três vezes), do Conselho de Pastores Evangélicos dos DF (duas vezes); participou de vários organismos batistas como o Conselho de Planejamento e Coordenação da Convenção Batista Brasileira, das juntas administrativas do Seminário Teológico Batista Equatorial e do Seminário Teológico Batista do Norte do Brasil; e por 20 anos foi professor da Faculdade Teológica Batista de Brasília ensinando as seguintes disciplinas: Estudos de problemas brasileiros, ética cristã, teologia pastoral, teologia contemporânea, ministério urbano, teologia bíblica do Antigo Testamento, e homilética. Como teólogo produziu muitos artigos, teses, e palestras nos mais diferentes lugares, e participou de muitos congressos, seminários, fóruns, retiros, entre eles o Congresso Internacional Lousane II realizado em Manila, Filipinas em 1989. Foi orador de várias assembléias convencionais, e pregou em muitos congressos e igrejas por todo o Brasil. Como poeta e escritor já gestou e publicou cinco livros (Missão da Igreja e responsabilidade social, Voando nas asas da fé, Um sonho coberto de rosas, Suave perfume, e Uma grande mulher), tem quatro prontos para publicação, e está grávidos de mais dez livros que espera escrever e publicar nos próximos oito anos. Na área política assessorou deputado Wasny de Roure, por muitos anos, tanta na CLDF como na Câmara dos Deputados; assessorou por pouco tempo os deputados distritais Peniel Pacheco e Arlete Sampaio; o Ministro da Educação, Cristovam Buarque, como chefe da Assessoria Parlamentar do MEC, e depois assessor parlamentar do Senador Cristovam Buarque. Nesta área produziu muitos escritos sobre os evangélicos e a política, fez inúmeras palestras, promoveu muitos seminários, e foi fundador e coordenador de vários fóruns, entre eles o Fórum Político Religioso do PT, o Fórum Religioso de Diálogo com GDF, o Fórum Cristão do PT Chegou a Brasília em junho de 1969 e, desde então, a elegeu como sua cidade do coração. Agora, aposentado, deseja dedicar-se a apenas duas atividades essenciais: pastorear graciosamente a Igreja Cristã de Brasília e Brasília, e escrever apaixonadamente. Sua grande ênfase ministerial tem sido o amor cristão, a graça maravilhosa de Deus revelada em Jesus Cristo, a responsabilidade social das igrejas e dos cristãos, e o ministério urbano da igreja.

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