Deus é Humilde
Série de sermões sobre “Deus é amor” (4): Pastor Julio Borges Filho
D E U S É H U M I L D E – 1 Jo 4:7-16; 1 Co 13:4b e 5
INTRODUÇÃO
– Já aprendemos a verdade fundamental segundo o apóstolo João: “Deus é amor”. E Paulo nos ensinou em 1 Coríntios 13 que Deus é paciente e é bondoso. Hoje a lição paulina é revolucionária: Deus é humilde porque “o amor não se ufana, não se ensoberbece… e não procura seus interesses”.
– Deus poderia orgulhar-se de si mesmo, mas não o faz porque o orgulho é a idolatria de si mesmo. Ele se abre para a criação e para o homem. O homem pecaminoso se vangloria de si mesmo atribuindo a si mesmo virtudes que não possui. As palavras gregas para a jactância vã são alazon e alazoneia. A primeira é usa por Paulo duas vezes: em Rm 1:30 e em 2 Tm 3:2; e a segunda é usada também duas vezes: em Tiago 4:16 e 1 João 1:16. Em todos esses versículos significam presunção, jactância, soberba, arrogância.
– A humildade é uma virtude característica da fé cristã, tanto que perguntaram a Jerônimo qual seria a primeira virtude cristã, e ele respondeu: humildade. E a segunda?, insistiram, e ele repetiu: humildade. E a terceira? – Humildade. Nietzche achava que a humildade era uma fraqueza indigna do super-homem. Mas, por que a afirmação “Deus é humilde” é revolucionária? – Porque nos obriga a mudar nossos conceitos sobre Deus, herdados do Antigo Testamento e, consequentemente, reavaliar nossas vidas. Nós cantamos exaltando a magnitude de Deus: “Grandioso és Tu”, “Tu és tremendo”. E isso nos faz sentir pequenininhos e insignificantes. Agora temos de cantar: Deus é humilde, e isso nos faz sentir importantes e fundamentais.
I. DEUS NÃO SE VANGLORIA
- 1. Imagens de Deus no Antigo Testamento
– O Deus Criador, criou a terra para nós humanos e nos criou conforme à sua imagem de semelhança provocando a ciúme do diabo segundo o Talmud e o livre de Sabedoria. Poderia Ele não criar o ser humano? – Não!… Não seria o Deus de amor se não o fizesse.
– O Deus do Monte Sinai causa-nos medo – Êxodo 19.
– O Deus que faz descer fogo do céu leva-nos perplexidade – I Reis 18.
– O Deus da visão de Ezequiel traz-nos espanto – Ezequiel 10.
– O Deus do qual não podemos fugir deixa-nos numa tensão infinita – Salmo 139.
– O Deus criador e infinitamente rico nos deforma – Teologia da prosperidade.
– A experiência marcante do profeta Elias no monte Horebe – I Reis 19: O Senhor não estava no grande e forte vento, nem no terremoto, nem no fogo. Deus estava no cicio suave com quem Elias teve um diálogo decisivo.
- 2. Como nos relacionar com Deus?
– Como o Deus da montanha que nos faz tremer? Com o Deus do fogo consumidor que nos deixa perplexos? Com o Deus da visão grandiosa de Ezequiel que nos faz desmaiar? Com o Deus onipresente, onipotente e onisciente do Salmo 139 que nos deixa tensos? Como o Deus que vem num vento suave? Esta última imagem é a mais próxima do Novo Testamento. O hino 96 do Cantor Cristão sempre me encantou pelas imagens fortes de Deus:
Se nos cega o sol ardente quando visto em seu fulgor,
Quem contemplará Aquele que do sol é criador?
Patriarcas e profetas O chegam a avistar,
Nem Adão chegou a vê-lo antes mesmo de pecar.
Luz pra qual o sol é trevas, quem te pode contemplar
Nossos olhos nus, humanos, não Te podem encarar.
Fogo em cima da Arca Santa, sarça ardente no Sinai,
São figuras só da glória do Senhor do Senhor, de Eterno Pai.
Para termos nós com Ele franca e doce comunhão,
Cristo, o Filho, fez-se carne, fez-se nossa redenção.
Para que na glória eterna nós miremo-lo sem véu,
Cristo padeceu a morte nova entrada abrindo ao céu.
– Não!… Deus não é um astro de rock que gosta de se vangloriar. Ele quer ser conhecido na sua intimidade. Por isso tornou-se homem em Jesus Cristo para que conhecêssemos o seu coração e a essência do seu ser. Assim podemos também cantar: “Tu és o Deus de nós pobres, o Deus humano e singelo, o Deus de pele curtida, o Deus caminhando na estrada…” A teologia do Pathos divino, do rabino Raschel, diz que o mundo e a história de Israel só foram possíveis por causa das humilhações de Deus. Ele desce a nosso nível para nos salvar. A encarnação de Jesus Cristo, na perspectiva cristã, seria a culminância dessas humilhações.
II. O DEUS HUMILDE REVELADO EM JESUS CRISTO
- 1. Na encarnação – Jesus nasceu humildemente numa invasão em Belém da Judéia, filho de uma moça simples da Galiléia dos gentios, e seus primeiros adoradores foram os pastores de Belém, homens simples e discriminados na sua época. Os grandes da terra não foram convidados para o primeiro Natal, mas anjos cantaram nos céus: “Glória a Deus nas maiores alturas, e paz na terra entre os homens a quem Ele quer bem”; e cientistas do oriente (os magos) vieram adorá-lo. O evangelista Lucas, que debruça mais no Evangelho da infância, descreve assim o nascimento de Jesus: “E ela deu à luz o seu filho primogênito, enfaixou-o e o deitou numa manjedoura, porque não havia lugar para eles na hospedaria.” – Lucas 2:7. Humildade maior não há.
- 2. Nos seus ensinos e ministério
– Ele nos ensinou a não buscar os primeiros lugares, a evitar as tentações egoístas de satisfação, vaidade e orgulho, a trilhar o caminho do amor e do serviço Ele colocou a humildade da criança como paradigma do Reino, e ensinou-nos a sermos abertos para todos e jamais preconceituosos, a não apontar o dedo acusador para ninguém, a amar os inimigos, e a colocar o Reino de Deus como princípio controlador de nossa vida. E mais: Desmascarou a falsa espiritualidade do seu tempo que se baseava na ostentação, identificou-se com os excluídos da sociedade (o sedento, o faminto, o nu, o preso, o estrangeiro), e na entrada triunfal em Jerusalém escolheu um jumentinho, símbolo da humildade, em vez da cavalo, símbolo do poder e da arrogância. Por isso podemos cantar com o Pastor Tarsis Wallace: “Sou aluno dele e de mais ninguém”.
– A sua oração de louvor ao Pai e o seu convite amplo revelam sua natureza: “Graças de te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque ocultaste estas coisas aos sábios e instruídos e as revelaste aos pequeninos. Sim, ó Pai, porque assim foi do teu agrado. Tudo me foi entregue por meu Pai. Ninguém conhece o Filho, senão o Pai; e ninguém conhece o Pai, senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar. Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração; e achareis descanso para a vossa alma. Porque o meu jugo é suave, e o meu fardo é leve” – Mateus 11:25-30.
–A parábola do fariseu e do publicano – Lucas 18:9-14. Jesus, afirma Lucas, contou esta parábola “a alguns que confiavam em si mesmos e desprezavam os outros. E conclui: “porque todo aquele que se exalta será humilhado, mas o que se humilha será exaltado.
- 3. Na sua morte na cruz do Calvário
– Um dos quadros mais fortes da paixão de Jesus é a cena do lava-pés onde se coloca como servo dos discípulos humildemente fazendo o trabalho que nem os escravos da época eram constrangidos a fazer. Deus não está interessado em gabar-se de sua virtudes. Ele quer é salvar o ser humano, coroa de sua criação.
– “Ele levou sobre si as nossas dores e enfermidades” – Isaias 53.
III. A REVOLUÇÃO DA HUMILDADE DIVINA
- 1. Na nossa adoração, deixaremos de ser pagãos para sermos cristãos. Não é um serviço nosso para Deus; é um serviço de Deus para nós lavando nossos pés sujos, curando nossas feridas, perdoando nossos pecados e fazendo-nos mais parecidos com Jesus. Isaias 64:4 é um dos meus versículos prediletos.
- 2. Na oração entramos na intimidade com Deus. Não é uma informação a Deus de nossas necessidades, mas comunhão com ele aqui e agora. Oração é abertura de coração. Acho que o versículo bíblico por excelência para a oração está em Apocalípse quando o Senhor se dirige à igreja de Laodicéia: “Eis que estou à porta e bato; se alguém ouvir a minha voz abrir a porta, entrarei em sua casa, com ele cearei e ele comigo” – Apocalípse 3:20
- 3. Na relação conosco mesmos, vem o reconhecimento de nossa finitude e, ao mesmo tempo, o reconhecimento de nossa grandeza de filhos de Deus em Jesus Cristo. Somos importantes para Deus, mas não somos superiores aos outros. Fomos apenas alcançados pela graça divina e devemos levá-la adiante para que todos também sejam alcançados. A humildade verdadeira significa transcendência do eu.
- 4. Na relação com os outros, nada de pré-conceitos, julgamentos a priori, mas abertura e disposição de servir. Não devemos jamais desistir do ser humano. Quando eu encontro alguém que me parece antipático, aproximo-me dele… Romanos 13:8 é outro versículo predileto. Jesus nos ensinou a ser o menor de todos e a prender a chorar. Li sobre um pastor que estava perdendo o amor da esposa e isso o deixava triste. Recuperou-o quando ela o viu chorando. A fraqueza dele acessou de novo seu coração.
- 5. Na missão da igreja, seguir o caminho de Jesus: “Assim como o Pai me enviou, eu também vos envio” – João 20:21. O desenvolvimento de uma verdadeira humanidade: a igreja como maquete para o mundo. Menachen Mendel afirmou: “Deus não lhe deu luz para que você a ostente no meio dia. Quando você recebe luz é para realizar algo, fazer alguma coisa nova e difícil. Vá pegar sua luz e transforme a escuridão fazendo-a brilhar também.”
- 6. Cultivar uma espiritualidade trinitária: verticalidade do Pai (olhar pra cima), horizontalidade do Filho (olhar para os lados), e profundidade do Espírito (olhar para dentro de si mesmo).
- 7. Cultivar a intimidade com Deus e evitar as vaidades do mundo
CONCLUSÃO
– Deus é amor. O amor é humilde porque não se ufana e não se ensoberbece… e não busca os seus interesses. Logo Deus é humilde. Tal humildade foi revelada em Jesus Cristo, Seu Filho. Tal verdade deve revolucionar nossas vidas.
– A receita paulina aos filipenses: “Se há, pois, alguma exortação em Cristo, alguma consolação de amor, alguma comunhão do Espírito, se há entranhados afetos e misericórdias, completai a minha alegria, de modo que penseis a mesma coisa, tenhais o mesmo amor, sejais unidos de alma, tendo o mesmo sentimento. Nada façais por partidarismo ou vanglória, mas por humildade, considerando cada um os outros superiores a si mesmo. Não tenha cada um em vista o que é propriamente seu, senão também cada qual o que é dos outros. Tende sempre em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, pois ele, subsistindo em forma de Deus, não julgou por usurpação o ser igual a Deus; antes, a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de servo, tornando-se em semelhança de homens e, reconhecido em figura humana, a si mesmo se humilhou, tornando-se obediente até a morte e morte de cruz. Pelo que também o exaltou sobremaneira e lhe deu o nome que está acima de todo nome, para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho, nos céus, na terra e debaixo da terra, e toda língua confesse que Jesus Cristo é Senhor, para a glória de Deus Pai”- Filipenses 2:1-11.
– Um alerta espiritual: Meu professor de história eclesiástica no Seminário, Paul Pierson, um presbiteriano, contou-nos em aula sua experiência quando menino numa igreja batista fundamentalista. A professora de juniores ensinava a classe a parábola do fariseu e do publicano. A campainha tocou marcando o fim do horário da EBD. A meninada saiu correndo, mas a severa professora chamou-os de volta dizendo: “Ainda não terminamos. Vamos agora agradecer a Deus porque não somos como aquele horrível fariseu”. Todos nós rimos e o grande professor olhou-nos firme dizendo: “Por que vocês estão rindo? Por que não são como aquela horrível professora?” Sorrimos amarelo. Ser humilde é ser afetado pelo amor Deus em Cristo sem nenhuma vanglória ou ostentação.