Sermões

O Deus Sofredor

Série “Deus é amor” (6):    O DEUS SOFREDOR – 1 João 4:7-16 e 1 Co 13:4-8 

         “Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. O amor jamais acaba”

                                                                                              Pastor Julio Borges Filho

INTRODUÇÃO:     

– A morte de Jusiel, meu filho, afetou toda a minha família, especialmente a Gil e a Julinho. Este, um pouco revoltado com Deus, um dia me disse:  “Pai, se você me provar que Deus sofre conosco, eu creio nEle”. Eu prontamente respondi: – “Filho, basta olhar para Jesus Cristo na cruz do Calvário”.

– A filosofia grega diz que Deus é impassível. Nele não há a diferença, a pluralidade, o movimento e o sofrer… A divindade impassível, imóvel, uno e auto-suficiente opõe-se ao mundo móvel, sofredor, disperso e jamais satisfeito em si mesmo. A substância divina é a base fundante, sustentadora, eterna e permanente em relação a este mundo de fenômenos transitórios, e, por isso mesmo, não pode estar submetida aos destinos desse mundo.

– Mas quando indagamos a mensagem teológica da tradição cristã encontramos como núcleo central a história da paixão de Cristo. Tal história é revivida na eucaristia na forma de pão e vinho. O que crê, crê por causa de Cristo. Como o Deus, segundo os gregos, que não pode sofrer está envolvido na paixão de Cristo. Como a fé cristã pode entender a paixão de Cristo como revelação de Deus? A cruz de Cristo força-nos a deixar de lado a apatia divina, herdada da filosofia grega, para a patia divina que, segundo Paulo, “não poupou Seu próprio Filho, mas entregou-o por todos nós” –Rm 8:32. Um Deus que é amor e, por isso mesmo, “Tudo sofre, tudo crê, tudo espera e tudo suporta”.

– Somos desafiados a sermos afetados pelo sofrimento de Deus.

  1. QUEM AMA, SOFRE – Geothe, o grande poeta alemão, disse: “Se eu fosse Deus, o sofrimento do mundo despedaçaria meu coração”.

Orígenes: “Ele (o Redentor) desceu à terra por compaixão pelo gênero humano. Ele sofreu os nossos sofrimentos antes de padecer na cruz e antes de dignar-se a assumir a nossa carne. Primeiro sofreu e depois veio a nós e tornou-se visível. Qual é o sofrimento que padeceu por nós? É o sofrimento do amor”. O próprio Pai não é impassível. Quando Ele é invocado, Ele se compadece e compartilha do sofrimento”.. Quando Orígenes fala do sofrimento de Deus, refere-se ao sofrimento do amor, do co-sentir (sim-patia) que é a essência da misericórdia. Há um texto misterioso no Novo Testamente que fala do sofrimento de Cristo antes que houvesse mundo.

– Abraham Heschel e a teologia do pathos divino – Para ele a criação, a libertação, a aliança, a história da salvação nascem do pathos de Deus. E é a experiência do pathos divino abre o homem para as  alegrias e as dores da vida. Com base na experiência judaica de Deus, Heschel desenvolveu uma teologia bipolar da Aliança: Deus reina no céu e ao mesmo tempo habita junto aos pequeninos e humildes. A simpatia de Deus é a base da simpatia do homem: o profeta é um homem cheio do Espírito de Deus.

– A doutrina cabalística da shekinab – A história do mundo é descrita mediante uma série de auto-humilhação divinas que constituem: a criação, a escolha dos patriarcas, a aliança com o povo, o êxodo e o exílio. A idéia da shekinab abrange os três aspectos seguintes: A habitação do Senhor no meio de Israel, o modo de condescendência do Eterno, e o prenúncio da glória daquele que há de vir. Conclusão: “O amor procura um parceiro que corresponda livremente e retribua o amor de espontânea vontade. O amor humilha-se por respeito à liberdade do parceiro. O amor de Deus criou a liberdade humana.

– O eterno sacrifício do amor – A teologia inglesa do século 19 e 20 retoma o tema do sofrimento de Deus em Cristo. C. S. Rolt: “Aquilo que Cristo fez no tempo, Deus, o Pai celeste, faz na eternidade e deve fazê-lo. Se Cristo é fraco e humilde na terra, Deus é fraco e humilde no céu, pois “o mistério da cruz”é o mistério que reside no coração eterno de Deus”. Por Deus suportar o mal, transforma-o em bem. O mal existe, não porque Deus o criou, mas precisamente porque deixou de criá-lo. O amor paciente e sofredor de Deus é a força criadora que “dá a vida aos mortos e chama à existência o que não existe” – Rm 4:17. O grande pregador e poeta Studdert Kennedy, após a 1ª guerra mundial: “Eu gostaria de converter o mundo para a adoração do Pai sofredor, que em Jesus Cristo se revelou… Deus Pai, o Deus do amor, está presente por toda parte na história, mas em parte alguma Ele é todo poderoso. Sempre e em todos os lugares vemo-lo como sofredor, sequioso, crucificado, mas triunfante. Deus é amor”.

– A teologia do processo – Deus não é imutável. Ele está em constante relação com a criação e com o ser humano, e está presente em todas as coisas (paneteismo).

2.  A PAIXÃO DE CRISTO – Jesus venceu todas as tentações do Diabo que lhe ofereceu caminhos diferentes (a economia, a manipulação e o poder) para ser reconhecido como o Salvador da humanidade, e optou pelo caminho do servo sofredor, pelo caminho da cruz e do amor.

     – Miguel de Unamuno – Através da mística espanhola da paixão este filósofo chegou a entender o mistério do mundo e o mistério de Deus: Na luta mortal de Cristo na cruz do Calvário manifestam o sofrimento do mundo inteiro e as preocupações de Deus. A vida é uma tragédia e uma contradição: a vida deseja viver e não morrer. A sede da vida é uma sede de eternidade. Assim nasce sua panenteística teologia do sofrimento: um Deus que não sofre também não ama. Este é o escândalo da cruz para judeus e gregos segundo Paulo. Quando se mais  se aprofunda na nossa aflição, tanto mais intensa a nossa  humanidade.  O mundo caminha para o fim do sofrimento de Deus e dos homens – 1 Co 15:19-28.  Aqui, no fim do tempo, Cristo entregará o Reino ao Deus e Pai, após ter castrado os principados e potestades e ter matado a morte. E, então, conclui Paulo: “Deus será tudo em todos”. E Deus enxugará de nossos olhos toda lágrima.

A liberdade – Berdiaev, grande pensador russo: A razão profunda da existência do mundo e sua história é a liberdade. O mundo teve início porque Deus desejou a liberdade. A fé cristã é a experiência da infinita liberdade que disso resulta (A Trindade Santa). Deus é plenamente livre: “Nos seus aposentos exteriores há tristeza; mas nos seus aposentos interiores existe altiva alegria” (H. Martensen).

– “Deus meu, Deus meu, por que me abandonaste?” A pergunta dramática dos lábios ressequidos de Jesus na cruz, resume das interrogações de todos os homens através dos tempos. É nos sofrimento que está a base do ateísmo de protesto do nosso tempo, mas é também no sofrimento que brota a mais pura fé. Respostas sobre Deus e o sofrimento humano:

1ª) Como consequência do pecado – Rm 6:23.

2ª) A morte como condição do homem finito (Clemente de Alexandria, Orígenes e outros).

3ª) O sofrimento dos inocentes (Livro de Jó).

4ª) Os padecimentos de Cristo traz em si a expressão máxima do amor. “Ele se fez pecado/ maldição por nós” – 2 Co 5:21 e Gl 3:13.

A resposta do Pai à pergunta angustiada do Filho, aconteceu na manhã de ressurreição. Um dia todas as lágrimas serão enxugadas, e agora já antegozamos isso  no Espírito Santo porque a última palavra não é do ódio, da injustiça e da morte, mas a do amor, da justiça e da vida.

 CONCLUSÃO:

– Na dor da morte de meu filho há mais de dez anos eu compreendi a dimensão do Calvário… Mas bem antes (1991), como pai, eu entendi o sofrimento de Deus quando gerei o poema em novembro de 1991 O sofrimento do Pai:

Eu sofri naquele dia no hospital

Vendo meu filho sofrer de um mal:

A extração de abcesso sem anestesia.

Compreendi o sofrimento sem igual

Do Pai ao ver o Filho na infernal

Dor que nos transforma e alivia.

 

Eu sofri naquele Pronto-socorro

E, antes mesmo, quase morro

Ao saber do triste acidente.

Agarrei-me ao Pai e, no momento,

A cruz não me saia do pensamento,

Pois Ele me aliava, Ele somente.

 

Compreendi que Ele não é insensível

E que seu sofrimento é terrível

Diante do pecado humano.

E Este Deus, nada impassível,

Dá-me uma alegria incrível,

E por Ele eu me apaixono.

 

Vejo-O através de Jesus Cristo,

E é só nEle que eu existo

E sofro na alegria de viver.

Quisera que todos vissem nisto

A beleza bela e infinita de Cristo,

E nEle vivessem o dom de crer.

 

Ser um pai é ser um ser vulnerável

De um coração sempre amorável,

Ser pai é precisamente sofrer.

Ser um pai é ser um ser dependente

Daqueles que se ama completamente.

O pai sofre por um pai ser.

 

Se Deus é Pai sofre eternamente

No Filho que foi morto cruelmente

Antes da fundação do mundo.

E só quando a morte estiver de luto

E o reinado de Cristo for absoluto,

E Deus for tudo em todos,

Não havendo mais fracos e engodos,

O sofrimento do Pai desaparecerá

E a dor não mais existirá.

Utopia imensa!… Mistério profundo!…

 

“Quem passou pela vida e não sofreu,

Passou pela vida, mas não viveu”.

 

Quem ama “Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta” . O amor jamais acaba” , é infinito, porque “Deus é amor”.

– Para seguirmos os passos de Jesus, somos desafiados a levar cada dia nossa cruz, o sofrimento necessário que nos torna mais humanos e mais divinos. Ou, como expressou o Apóstolo Paulo, temos o desafio de completar em nossos corpos mortais os sofrimentos de Cristo no mundo.

Júlio Borges de Macedo Filho

PASTOR JULIO BORGES DE MACEDO FILHO Piauiense de Curimatá, 72 anos com 48 de pastorado, filho de Julio Borges de Macedo e Arquimínia Guerra de Macedo, é o sétimo filho de uma família de onze irmãos. Casou-se, há 48 anos no dia de sua ordenação ao ministério pastoral, com a professora Gislene Rodrigues Lemos de Macedo e tiveram quatro filhos: Juliene, Jusiel (falecido), Julinho e Julian. Agora Deus lhe deu a primeira neta chamada Sarah, de apenas 8 anos. Concluiu o curso de Bacharel em Teologia pelo Seminário Teológico Batista do Norte do Brasil, em Recife. Formou-se em 1969 e foi ordenado ao ministério pastoral no dia 22 de fevereiro do mesmo ano. Pastoreou as seguintes igrejas: Igreja Batista do Rio Largo – AL (1969 a 1972), Primeira Igreja Evangélica Batista de Teresina – PI (1972 a 1978), Primeira Igreja Batista de Ilhéus – BA (1978 a 1979), Terceira Igreja Batista do Plano Piloto – Brasília (1979 a 1989), Igreja Batista Noroeste de Brasília (interinamente em 1985), Primeira Igreja Batista de Curimatá – PI (interinamente em 2000), e desde 1989, a Igreja Cristã de Brasília. Tomou a iniciativa para a organização das seguintes igrejas: Primeira Igreja Batista de Picos –PI, Igreja Batista do Lago Norte – Brasília, Igreja Batista Noroeste de Brasília (hoje, Igreja Batista Viva Esperança), e a Igreja Cristã de Brasília. Ordenou cerca de 20 pastores e uma pastora, consagrou dezenas de diáconos e diaconisas por onde passou, e celebrou mais de 500 casamentos. É considerando no Distrito Federal um pastor de pastores. Líder denominacional foi presidente da Convenção Batista Alagoana, da Convenção Batista do DF (três vezes), do Conselho de Pastores Evangélicos dos DF (duas vezes); participou de vários organismos batistas como o Conselho de Planejamento e Coordenação da Convenção Batista Brasileira, das juntas administrativas do Seminário Teológico Batista Equatorial e do Seminário Teológico Batista do Norte do Brasil; e por 20 anos foi professor da Faculdade Teológica Batista de Brasília ensinando as seguintes disciplinas: Estudos de problemas brasileiros, ética cristã, teologia pastoral, teologia contemporânea, ministério urbano, teologia bíblica do Antigo Testamento, e homilética. Como teólogo produziu muitos artigos, teses, e palestras nos mais diferentes lugares, e participou de muitos congressos, seminários, fóruns, retiros, entre eles o Congresso Internacional Lousane II realizado em Manila, Filipinas em 1989. Foi orador de várias assembléias convencionais, e pregou em muitos congressos e igrejas por todo o Brasil. Como poeta e escritor já gestou e publicou cinco livros (Missão da Igreja e responsabilidade social, Voando nas asas da fé, Um sonho coberto de rosas, Suave perfume, e Uma grande mulher), tem quatro prontos para publicação, e está grávidos de mais dez livros que espera escrever e publicar nos próximos oito anos. Na área política assessorou deputado Wasny de Roure, por muitos anos, tanta na CLDF como na Câmara dos Deputados; assessorou por pouco tempo os deputados distritais Peniel Pacheco e Arlete Sampaio; o Ministro da Educação, Cristovam Buarque, como chefe da Assessoria Parlamentar do MEC, e depois assessor parlamentar do Senador Cristovam Buarque. Nesta área produziu muitos escritos sobre os evangélicos e a política, fez inúmeras palestras, promoveu muitos seminários, e foi fundador e coordenador de vários fóruns, entre eles o Fórum Político Religioso do PT, o Fórum Religioso de Diálogo com GDF, o Fórum Cristão do PT Chegou a Brasília em junho de 1969 e, desde então, a elegeu como sua cidade do coração. Agora, aposentado, deseja dedicar-se a apenas duas atividades essenciais: pastorear graciosamente a Igreja Cristã de Brasília e Brasília, e escrever apaixonadamente. Sua grande ênfase ministerial tem sido o amor cristão, a graça maravilhosa de Deus revelada em Jesus Cristo, a responsabilidade social das igrejas e dos cristãos, e o ministério urbano da igreja.

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