OS PAIS DO RISO
Sermão : OS PAIS DO RISO Gn 17:15-22, 18:9-15 e 21:1-7
Abraão é conhecido como o Pai da Fé, o Pai de Nações, Mas hoje eu quero apresentá-lo juntamente com Sara, como os Pais do Riso. Ela nos convidam ao riso: “Toda aquele que ouvir isso vai rir-se comigo”. Rir é a saúde da alma. O ser humano gosta do riso. Só os chatos e amargos não gostam de rir. O saudoso escritor italiano Umberto Eco no seu livro “o Nome da Rosa” que virou filme com Sean Connery, nos conta a história de um monge que não ria e defendia que Jesus nunca riu. Era um assassino. Desconfie da pessoa que não ri.
Acompanhemos a história sagrada do patriarca e da matriarca. Eles, já velhos (Abraão com 99 anos e Sara com 89 anos), são os pais de Isaque (riso) e aprendamos que a fé é amiga do riso. Por isso o riso é revolucionário.
SAINDO SORRINDO PELA FÉ DE SUA TERRA… Gn 12:1
O riso é subversivo: “Saia da tua cultura e tua parentela…” Imagino que Abraão e Sara saíram sorrindo porque a fé vê o invisível e a alma sempre rebelde sorri com tal visão. Romper com tudo que nos bloqueia para sermos o que Deus quer de nós é o segredo da vida. O riso é a poesia da alma.
O riso é aventureiro, peregrino: ele nos ensina o desapego. Daí o fracasso de muitos casamentos: um se julga dono do outro. A opção preferencial de Deus por caminhos libertadores é clara no AT. No tempo de Abraão havia as cidades estados como Sodoma e Gomorra que oprimiam e escravizavam o campo. Ezequiel 16:49 afirma que a iniquidade de Sodoma era: “soberba, fartura de pão e próspera tranquilidade teve ele e suas filhas, mas nunca amparou o pobre e o necessitado”. Deus promete a Abraão que “em ti serão benditas todas as família da terra”. Ele não se conformava com os sistemas iníquos de sua época porque, segundo Hebreus 11:10 sonhava com a cidade que tem fundamentos cujo arquiteto e edificador é Deus. Por isso era desapegado e não possuiu terras. Vivia da promessa. O apego ameaça e violenta a integridade da pessoa. Israel não compreendeu a promessa de ser uma bênção para o mundo. As escavações arqueológicas de Tersa, cidade do tempo dos juízes e do reinado, mostram que no tempo dos juízes havia justiça social porque as casas eram semelhantes. Já as do tempo do reinado mostrava os palacetes e os casebres. Só em Jesus Cristo a promessa de Abraão se concretiza. O próprio Jesus afirmou que “Abraão, vosso pai, viu o meu dia e se alegrou” (Jo 8:56). Nós que vivemos de acordo com os ideais do Reino não podemos nos conformar com as estruturas iníquas deste mundo.
O riso de Abraão diante de Deus: podemos rir na oração ((Gn 17:17 e 18). Quando Deus, conversando com Abraão lhe diz que ele teria um filho de Sara, ela aos 89 anos e ele aos 99, Abraão colocou sua cabeça em terra e rolou de rir. Isso só pode ser uma piada. Rir-se de se mesmo revela saúde espiritual. O bem humorado Senhor entendeu tal riso e disse que o filho teria o nome de Isaque (ele ri ou riso).
ENTENDENDO A PROMESSA DE DEUS: UM PROCESSO
A primeira solução: O sobrinho Ló. Quando Abraão saiu e constatou que Sara era estéril. Trouxe seu sobrinho predileto, filho de seu irmão Harã que havia falecido. Tera, seu pai, queria ir à Palestina, mas também morreu. Ló só lhe trouxe aborrecimentos. Conta-se que havia um menino chamado João que tinha uma coleção de bolas de gude que ele gostava muito, mas dentre as bolas, havia uma azulzinha que era a sua predileta. Ele a conhecia no toque do dedo em seu bolso onde carregava as bolas para brincar. Mas lá vem Maria com as mãos cheias de chocolates e João amava chocolate. Salivando pediu a Maria os chocolates. Ela, esperta, disse: “Só se você me der todas as sua bolas de gude.” Ele concordou, tirou as bolas do bolso, menos a azulzinha, e entregou a Maria. “Você está me entregando todas?, perguntou Maria. “Todas”, mentiu João. Esse é o nosso problema em nossa superficial consagração a Deus. Cantamos “Tudo entregarei”, mas não o nosso pecado predileto. Este, como Ló, só causa problemas. Os pastores de Ló brigaram com os pastores de Abraão. Abraão chama seu sobrinho e propõe a separação como solução do problema e manda Ló escolher a terra de sua predileção. O ganancioso Ló pediu as terras férteis do Jordão e “foi armando suas tendas até Sodoma”. Por causa de Ló Abraão foi à guerra embora fosse um homem de paz. Ló foi levado cativo na guerra dos 5 reis contra 4 Abraão organizou um exército de 300 homens e o trouxe de volta derrotando os raptores. Foi aí que ele se encontrou com Melquisedeque, o sacerdote do Deus Altíssimo e lhe deu o dízimo de tudo. Finalmente, na destruição de Sodoma, Ló foi o responsável porque Abraão conseguiu de Deus que se houvesse 10 justos na cidade ela seria poupada. Se Ló tivesse ganhado sua família (4 pessoas), seus genros e os pais de seus genros (8 pessoas) teria salvado a cidade. Fugiu na marra obrigado pelos anjos, sua mulher olhou com saudade para trás e virou uma estátua de sal, e suas filhas tiveram filhos do próprio pai dando origem aos moabitas e amonitas que foram os maiores inimigos de Israel.
A solução de Sara: Agar, gerando uma confusão histórica. Bem, disse Sara a Abraão: “Deus disse que o filho seria seu e não meu. Já que não posso ter filhos, aqui está minha escrava egípcia. Tenha um filho com ela.” Abraão achou uma boa solução. Só provocou o ciúme de Sara porque Agar achou-se melhor do que ela e, quando Isaque nasceu, Sara achou que o ágil Ismael fazia bullying com seu filho. Deus não abandonou Agar quando foi expulsa por Sara. Prometeu a Abraão que cuidaria dela e do filho Ismael que geraria 12 príncipes dando origens aos Árabes. O livro do rabino Nilton Bonder O CAMINHO DE ABRAÃO provou em mim o desejo de andar por onde o patriarca andou. Foi uma iniciativa da Universidade de Harvard que reuniu 36 representantes das religiões abraãmicas (judaísmo, cristianismo e islamismo) para percorrerem o caminho de Abraão saindo de Ur e Harã na Turquia e terminando em Hebrom onde se acha os túmulo do patriarca e da matriarca. O rabino, conhecedor profundo do AT, narra a jornada e faz comentários inteligentes em cada parada. Conta, por exemplo, que há lugares onde pastores continuam com o mesmo estilo de vida de Abraão com histórias milenares sobre ele. É bom que se diga que, para os islâmicos, o filho da promessa é Ismael e não Isaque..
Sara desistiu: já não esperava mais. Sara é uma mulher linda, mas estéril. Por causa de sua beleza Abraão teve duas crises de fé. No Egito compactuou com Sara para dizerem que ela era sua irmã e Sara terminou no harém de Faraó, mas Deus a defendeu (Gn 12:10ss). Em Gênesis 20 novamente Abraão mentiu e Sara foi levada para a casa de Abimeleque, rei de Gerar, que foi impedido através de um sonho por Deus de tocá-la. Esse texto derruba a ideia de Abraão de que naquela terra ninguém temia a Deus. Bem, nessas duas ocasiões faltou ao patriarca a fé e o riso. E Sara, sem o riso, já não esperava mais.
GESTANDO E AMAMENTANDO NA VELHICE
A visita dos anjos em Gênesis 18:1-15 mostra Sara, aos 89 anos, rindo quando ouviu o Senhor dizer a Abraão que ela lhe daria um filho em um ano. Acho que ria de si mesma (“Ainda terei prazer?”) e ria do impossível. O Senhor afirma que não se pode mentir a Deus.
A gravidez aos 89 anos é uma comédia. Isso significava que Sara sentiu o prazer do orgasmo, voltou a menstruar e se engravidou, e viveu muito mais: 127 anos. Celebrou o nascimento de Isaque (riso) dizendo: “Deus me deu motivo de riso, e todo aquele que ouvir isso vai rir-se juntamente comigo”. E hoje após tantos anos somos convidados por ela a rir dessa história.
A tristeza do caminho até o monte Moriá e a alegria da volta (Gn 22). Três dias de viagem. Isaque deveria ter, segundo Josefo, 25 anos. “Pai, eis aqui a lenha e o fogo, mas onde está o cordeiro para o holocausto? Pergunta. Resposta do Pai: “Deus proverá…” E quando Abraão levantou o cutelo para imolar seu filho, o anjo interviu rápido e não permitiu. Era o não divino a sacrifícios humanos. E Deus sorriu porque as batidas do coração de Abraão batia no ritmo do seu coração. Abraão, por amor a Deus, estava disposto a abrir mão do filho da promessa porque, segundo o escritor aos hebreus, ele cria que Deus poderia ressuscitá-lo. E isso lembra-nos o Calvário quando o Pai entregou seu único Filho por nós e no terceiro dia o ressuscitou dentre os mortos. Kierkegaard no seu livro “Temor e Tremor” define assim a relação de Deus e Abraão: “Abraão não seria o Abraão de Deus se tivesse Lhe negado seu filho, mas Deus não seria o Deus de Abrão se tivesse permitido que Isaque fosse sacrificado.”
O casamento de Isaque com Rebeca é lindo. Rapaz tímido, criado com muito carinho e proteção pela mãe, sofre quando Sara morre. Abraão anda, sob juramento, seu mordomo ir à terra de seu pai buscar uma esposa para seu filho. O mordomo era um homem sábio e temente a Deus. Ao chegar na cidade de Naor, irmão de Abraão, parou a beira do poço onde as moças viriam pegar água. Sua oração dizia que Deus o orientasse porque ali ele queria encontrar a esposa de seu senhor. Teria de ser simpática, bonita e esperta e da família de Abraão. E enquanto ele orava Rebeca já estava a caminho e tudo o que ele pediu, aconteceu. Presenteou-a e ela lhe ofereceu hospedagem. Contou a seu pai e a seu irmão Labão. O mordomo de Abraão não perdeu tempo: falou do objetivo de sua viagem e de como fora o seu encontro com Rebeca no poço. Quando Labão pergunta à sua irmã se ela queria ir, ela prontamente concordou. Ao chegar ela vê de longe Isaque em suas meditações no deserto, cobre-se. Isaque leva-a para tenda de sua mãe, ama-a e é “consolado pela morte de Sara.” Razão tem Zé Ramalho em sua linda canção: “Mulher nova, bonita e carinhosa faz o homem gemer sem sentir dor”. O Riso era só riso e foi o única patriarca monogâmico.
Na revista Seleções tem um item “Rir é o melhor remédio”. De fato o riso é terapêutico. O Apóstolo Paulo em sua carta aos filipenses aponta quatro ladrões da alegria: pessoas, necessidades, circunstâncias adversas e solidão. E os enfrentou revelando sua sadia espiritualidade: sozinho, preso, quase cedo escreveu o livro mais alegre da Bíblia.
Deus é bem humorado. Vejo sua alegria no céu estrelado, na luz cheia, no nascer e no pôr-do-sol, no sorriso de um bebê, no cântico dos pássaros, na esperteza do macaco, na beleza das árvores e flores, no murmúrio das ondas do mar e das cachoeiras, etc. Jesus era alegre: gostava de festas, de uma boa comida e bebida, gostava de colocar apelidos, etc. Acho que o riso, como o parto de Sara, tem de ser gestado e cultivado até se transformar em um estilo de vida.
O riso é cosmético: “O coração alegre aformoseia o rosto…”; dá moral e comunica força: “A alegria do Senhor é a nossa força”; é companheiro nas horas difíceis da vida: “Alegrai-vos sempre no Senhor…”
O mesmo poder que fez Sara engravidar aos 89 anos e ressuscitou Jesus dentre os mortos nos dando a alegria da ressurreição, opera em nós… Por isso, nada de desânimo e amargura. Vivamos alegremente como pais e mães do riso.