VIDAS ILUMINADAS
Sermão: VIDAS ILUMINADAS – Lucas 11:37-44
Julio Borges Filho
A canção Disparada, de Geraldo Vandré, fez história durante a ditadura militar (duas estrofes apenas):
Prepare o seu coração pras coisas que eu vou contar
Eu venho lá do sertão, eu venho lá do sertão
Eu venho lá do sertão e posso não lhe agradar
Aprendi a dizer não, ver a morte sem chorar
E a morte, o destino, tudo, a morte e o destino, tudo
Estava fora do lugar, eu vivo pra consertar
…………..
Então não pude seguir valente em lugar tenente
E dono de gado e gente, porque gado a gente marca
Tange, ferra, engorda e mata, mas com gente é diferente
Se você não concordar, não posso me desculpar
Não canto pra enganar, vou pegar minha viola
Vou deixar você de lado, vou cantar noutro lugar
Tem muita gente que canta para agradar e enganar e que diz sim quando deveria dizer não. Isso é um desvio fatal para a vida… Viver de aparências. São as trevas dominando a vida. Resultado: suicídios, hipocrisia, divisão interior, doenças, desespero… O fariseu do Evangelho de hoje vivia assim e esperava que assim Jesus vivesse. Tornemos real esta página do Evangelho em nossas vidas.
VIDAS ILUMINADAS, 11:33-36
“Ao falar Jesus estas palavras, um fariseu o convidou para comer em sua casa”. O contexto bíblico imediato nos diz que o que mais impressionou ao fariseu foi a parábola da candeia onde Jesus ensina que ninguém acende uma candeia e a esconde para bloquear sua luz, mas em lugar estratégico para iluminar toda casa. Diz que nossos olhos são as janelas da alma, e que devemos encher nossas mentes e corações de imagens luminosas para termos vidas iluminadas, sem trevas, mas autênticas. O corpo deve ser o templo do Espírito Santo, resplandecente, capaz de iluminar outros.
O curioso e educado fariseu convidou outros amigos para a refeição. Só não esperava um convidado incômodo e perturbador. Jesus aceitou o convite e foi diretamente para a mesa.
A ADMIRAÇÃO/DECEPÇÃO DO FARISEU, V.3
Jesus foi logo decepcionando o anfitrião porque não lavou as mãos. Frustrou suas expectativas. Sua admiração foi pura decepção. Talvez pensasse ele que Jesus poderia ser um bom rabi fariseu, zeloso da lei e dos bons costumes. Acho que Jesus fez de propósito para provocar, e sua dura reação é uma expressão de amor. Para quem acho que é dono da verdade, só o choque desmascarador…Quando professor na Faculdade Teológica Batista de Brasília avisava os alunos já na primeira aula: “Minha missão como professor é confortar os perturbados e perturbar os confortados.” Não podemos viver de acordo com as perspectivas dos outros e trairmos a nós mesmos.
AS ACUSAÇÕES DE JESUS, vrs 39ss
São demolidoras. Os fariseus tinham um vida interior maldosa sem preocupação com os pobres. Por isso eram vaidosos e viviam em trevas e na ilusão de que eram guias seguros. Recentemente assisti o maestro Issac Karabtchevshi regendo a Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional Claudio Santoro, e fiquei impressionado com o talento dele regendo 90 instrumentos numa sinfonia inesquecível. Pensei comigo: Se é verdade que o Lúcifer, o anjo de luz, era maestro e ficou tão vaidoso que desejou ser igual ao Altíssimo, tal não acontece com o nosso maestro. Em sua biografia consta que ele gosta de reger em hospitais e para comunidades pobres da periferia. Cultiva a humildade que consiste quando reconhecemos que nossos talentos são dons do Alto e devemos doá-los aos mais necessitados. Por isso os anjos cantaram para os humildes pastores de Belém anunciando o nascimento do Salvador. E aí vem os três ais de Jesus contra os fariseus que lhe roubaram o apetite.
O primeiro ai é sobre o dízimo que eles praticam das pequenas coisas e desprezam o essencial: a justiça e o amor de Deus. Quando fui assessor do Senador Cristovam recebi uma demanda de uma funcionária terceirizada que estudava pedagogia no Faculdade Evangélica em Taguatinga. Estava sem poder pagar a dívida e com medo de perder o curso. Era da Igreja Universal. Consegui diminuir a dívida dela pela metade com o diretor da faculdade ficando apenas dois mil reais para pagar. Fui, então, conversar com o bispo de sua em Brasília. Recebeu-me bem e eu lhe disse: “Bispo, vocês tiram muito dinheiro do povo. Chegou a hora de vocês ajudarem a uma membro de sua igreja em Ceilândia. Contei o problema. Ele foi logo diagnosticando que se ela estava assim era porque não era dizimista e Deus não estava abençoando. Senti vontade de dar-lhe um tapa na cara, mas educadamente, desisti ruminando comigo mesmo: “Eis um fariseu que ama o dízimo mais do que a justiça e o amor de Deus.”
O segundo “ai de vós fariseus” denuncia que eles gostam de ser admirados e dos primeiros lugares nas sinagogas. Eram vaidosos e ostentadores. Alguém disse que havia, no tempo de Jesus, sete tipos de fariseus: 1) O amante de Deus como Gamaliel; 2) o temente a Deus com Saulo de Tarso, 3) o contador que contava seus pecados e seus atos bons, 4) o parcimonioso que compensava cada pecado cometido com uma boa ação, 5) o presunçoso que mandava a pessoa esperar enquanto ele fazia uma boa ação para Deus; 6) o compensador que compensava cada pecado cometido com um mandamento cumprido, e 7) o ostentador que mandava bordar nas franjas de suas veste suas boas obras. No meu primeiro pastorado em Rio Largo nas Alagoas fui eleito presidente da Convenção Batista Alagoana no seu cinquentenário. Um dia que estava dando expediente na sede da convenção, o pastor Azor da Primeira Igreja Batista de Arapiraca me telefonou pedindo-me para ir presidir uma assembleia de sua igreja em que ele iria pedir exoneração do pastorado. Disse que a igreja estava em pé de guerra porque o líder da oposição a ele queria humilhá-lo. Fui e pedir para me hospedar com o líder da oposição ao pastor, o irmão Artur. Ele recebeu-me muito bem, mas logo descobri que se tratava de um fariseu ostentador. Levou-me ao terceiro andar de sua boa casa e mostrou o seu cenáculo dizendo: “Pastor, é aqui que eu oro a Deus e tenho minhas visões”. E dizia isso com voz trêmula e piedosa. Eu resolvi tirar vantagem disso dizendo-lhe: “Irmão Artur, já que o irmão é um homem de oração vamos resolver o problema do pastor Azor em paz.” E orientei como deveria ser a assembleia da igreja para que não houvesse escândalo. Ele concordou e o povo ficou frustrado. O templo estava lotado com gente pendurando até nas janelas, mas a assembleia foi tranquila e minhas sugestões foram todas acolhidas por unanimidade: 1) Aceitar o pedido de exoneração do pastor e dar-lhe carta de transferência para a Igreja de Penedo; 2) garantir três meses de salário integral a ele; 3) convidar o Pastor Miquéias Barreto, da Primeira Igreja Batista em Palmeiras dos Índios, para assumir o pastorado interino da igreja. O sábio pastor Miquéias, ao assumir o pastorado, colocou o irmão Artur para dirigir uma congregação na periferia da cidade para evitar problemas na sede e para aprendizado com os pobres.
O último ai é duro. Jesus os acusa de serem “sepulcros invisíveis” que se misturavam com povo e contaminavam (Nm 19:16) as pessoas que os julgavam serem pessoas de bem. Eram “zumbis”, mortos-vivos que cheiravam mal. O fariseu era um religioso, mas não era autêntico adorador de Deus.
Foi então que um escriba reclamou: “Mestre, dizendo estas coisas, também tu ofendes a nós outros”, e sobrou para eles também três ais (vrs. 46-52): 1) “Ai de vós doutores da lei”, porque sobrecarregam as pessoas com fardos que vocês não carregam; 2) Edificam os túmulos dos profetas que seus pais assassinaram; e 3) Tomaram a chave da ciência… e não entram no Reino e impedem os que querem entrar.” Imagino que todos perderam o apetita e Jesus “foi cantar noutro lugar’. E eles, ao invés de se arrependerem, fizeram aliança contra Jesus. A verdade dói e machuca, mas, se absorvida, cura.
Conclusão: viver de acordo com as perspectivas dos outros leva a suicídios de pastores… Eles conhecem a si mesmo, mas suas ovelhas o consideram um santo e ele, iludido, acredita e se desencontra. O pastor João Pedro de Araujo escreveu no facebook: “Pastores das igrejas neopentecostais dominam as ovelhas; pastores de um igreja tradicional são dominados pelas ovelhas.” Triste verdade.
Jesus vivia sob a vontade do Pai e era autêntico, puro por fora e por dentro. Não vivia para agradar e, por isso mesmo foi assassinado. Seus assassinos o amavam e o invejavam, mas, como não conseguiam ser com ele, resolveram matá-lo como um herege e um subversivo político. Eles o invejavam por ele era luminoso e clareava a vida das pessoas.
Somos seres únicos e temos a missão de sermos nós mesmos e assim iluminarmos os outros, e com voz profética denunciarmos o mal que contamina com a escuridão. Pastor Varcílius Constantinides, então diretor da APEC, contou-me como se deu a conversão de sua esposa. Menina ainda, assistiu um culto na Primeira Igreja Batista de Itabuna na Bahia. A igreja cantou o hino 239 CC: “Deixa a luz do céu entrar…” e ela foi tocada profundamente. 20 anos depois, já namorando com ele em São Paulo, ele a levou para um culto na Primeira Igreja Batista, e quando foram entrando a igreja cantava: “Cristo a luz do céu em ti quer habitar/para as trevas do pecado dissipar. Abre então de para a par teu coração/ e deixa a luz do céu entrar”. E coro do hino era imperativo: “Deixa a luz do céu entrar/ deixa a luz do céu entrar/ Abre bem a porto do coração e deixa a luz do céu entrar”. Ele sentou-se num banco e chorou copiosamente e abriu a porta do seu coração. Deus nunca desiste de nós…
Diante deste texto e das palavras duras de Jesus, nós somos chamados a um autoexame, a olhar para dentro de nós mesmos, e diante do Deus tudo conhece, orarmos corajosamente: “Sonda-me, ó Deus, e conhece o meu coração. Prova-me e conhece os meus pensamentos. E vê se há em mim algum caminho mau e guia-me pelo caminho eterno” ( Salmo 139:23 e 24.
CONCLUSÃO:
– Viver de acordo com as expectativas dos outros. Suicídios de pastores: “Pastores das igrejas neopentecostais dominam as ovelhas; pastores de uma igreja tradicional são dominados pelas ovelhas.
– Jesus vivia sob a vontade do Pai e era autêntico, puro por fora e por dentro e, por isso mesmo assassinado. Os assassinos eram invejosos.
– Somos seres únicos e temos a missão de sermos nós mesmo e assim iluminarmos a outros, e com a voz profética de denunciarmos o mal que contamina.