PARAPANA´, FLORES E ESCORPIÕES
PARAPANA´, FLORES E ESCORPIÕES
Julio Borges Filho
Sempre que minha esposa me convida para assistir uma peça dirigida por Fernando Guimarães, eu prontamente aceito. Certamente algo de bom nos espera. Desta feita a peça teatral foi Parapaná, Flores e Escorpiões, em que Fernando e o Coletivo Coletivo visitam obras do genial Gabriel Garcia Márquez e seus arquétipos da cultura da América Latina, com belo elenco de dez atores e atrizes com especial destaque para Yara de Cunto. Palco: Galeria de Vidro do Espaço Cultural Renato Russo em Brasília. Gostei e aplaudi muito porque me inspirou e trouxe-me recordação de minha infância em Curimatá-PI.
Tudo gira em torna da família Buendia na cidade de Macondo fundada por ela com seus personagens fantásticos que resistiam às chuvas torrenciais, a escorpiões, à insónia e perda da memória e a guerras infindáveis. Daí o tema “Parapaná” (termo de origem tupi para coletivo de borboletas significando a metamorfose ambulante das pessoas), “Flores e Escorpiões” (as alegrias, paixões e intempéries) que expressa bem com contexto em que vivia o núcleo da família com homens e mulheres fortes em torno da matriarca Úrsulla (Iara de Cunto). É a vitória da vida sobre a morte como bem expressou Garcia Márquez: “Apesar da opressão, do saque e abandono, respondemos com a vida. Nem enchentes, nem pragas, nem fome, nem cataclismos, nem mesmo as eternas guerras, séculos após séculos, foram capazes de subjugar a persistente vantagem que a vida tem sobre a morte”. Pertencer a um lugar é um tema forte como expressa a firme resposta de Úrsula, a matriarca, quando alguém lhe diz que não pertencemos a um lugar se nele não temos um morto: “Pois se for preciso que eu morra para que este lugar seja nosso, eu morro.”
A peça termina como um pequeno hino que me levou à minha infância quando ouvia católicos cantar em procissões e missas:
“A nós descei, divida luz!
A nós, descei, divina luz!
Em nossas almas acendei
O amor, o amor de Jesus!
Em nossas almas acendei
O amor, o amor de Jesus!”
Este pequeno e grande hino me transportava para o clamor de minha alma de criança e, aqui, ao ouvi-la de novo nas vozes dos atores, ela reviveu em mim o mesma paixão de toda a minha vida. Saí cantando, e dormi cantando a bela e sucinta oração que expressa a beleza da vida cristã: amar como Jesus nos amou.
E, para minha sopresa e alegria, após os aplausos de encerramento, um ator disse: “A apresentação desta noite é dedicada a Gil Macedo”. Novos aplausos. Outro acrescentou: “E a Iara de Cunto…” Mais aplausos… Abracei a minha grande mulher com santo orgulho e depois à veterana atriz. Elas mereceram a homenagem.
Brasília, 13 de julho de 2023